STF e o morto que o Tribunal condenou a manter vivo

STF e o morto que o Tribunal condenou a manter vivo

É sempre mais fácil desviar o olhar das coisas que nos incomodam – o homem com deficiência que pede esmola no semáforo, o carente que precisa da nossa atenção, as imagens de pessoas morrendo de fome na Somália. No entanto, ninguém está praticando melhor essa autodefesa no Brasil de hoje do que a indiferença diante da injustiça mais evidente da história do país: os processos de Brasília para julgar o suposto “golpe armado” de 2023.

Pense em qualquer crime que possa ser cometido contra o réu em um processo penal – o STF já cometeu. Pense em ofensas diretas ao raciocínio lógico, em falsificação de fatos ou mentiras com provas físicas – o STF, a PGR e a Polícia Federal usam todas essas táticas baixas para criar realidades e fabricar histórias contra os acusados. Pense nos ex-comandantes do Exército e da Aeronáutica, as principais evidências da acusação, que não disseram nada útil em seus depoimentos. É melhor fechar os olhos.

Os processos de Brasília têm um problema insuperável: não houve tentativa de golpe de Estado para punir. Como não houve golpe, não há provas sérias de que ele tenha ocorrido. Como não há golpe e nem provas, não há culpados. Culpados de quê, se não houve crime? A solução que o ministro Alexandre de Moraes e o STF encontraram para essa dificuldade foi um decreto simples: tudo o que a polícia diz, e a PGR repete, é considerado prova.

A PF afirma, por exemplo, que um oficial do Exército esteve rondando a casa do ministro Moraes em um determinado dia e hora, com más intenções – e por isso o homem está preso há seis meses, com uma pena de 30 anos. A prova? O STF diz que isso aconteceu porque a PF diz que foi assim. O que mais querem? A defesa provou, com dados do celular do acusado, que ele estava em uma festa de aniversário no momento em que, segundo a polícia, estaria na campana do ministro. A PF não incluiu isso em seu relatório.

É tudo assim – e daí para pior, até o absurdo puro. Talvez nada demonstre melhor essa fraude gigante do que a cena do ministro Moraes interrogando o delator que ele próprio e a PF apresentam como testemunha-chave. Moraes diz que o delator precisa “preencher lacunas” na sua delação – ou preenche, ou vai para a prisão, ele, seu pai, mulher e filha. Ou seja: a principal peça da acusação não tem valor jurídico.

O “golpe armado” é um cadáver que o STF se condenou a manter vivo. A cada dia, vai se enterrar mais, exibindo ao mundo sua ignomínia.

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